domingo, 3 de julho de 2011

sobre meninos, meninas e gibis

Não acompanho futebol desde 2007. Manter-se totalmente alheio ao assunto, porém, seria um feito irrealizável. Contou-me um passarinho - o Twitter, no caso - que a seleção feminina vem dando espetáculo após espetáculo na Copa do Mundo, com destaque para a jogadora Marta. Já o time masculno não saiu de um mísero empate em zero com a Venezuela (Venezuela!) num jogo, no mínimo, lamentável. E eu soube também que, perto dos milhões e milhões que movem a equipe masculina para onde ela vá e não importa o quão feio faça, Marta e suas intrépidas colegas contam com um orçamento proporcionalmente modesto.
Se futebol é tema assim tão inescapável, vejo que cada um pode dar pitaco, mesmo quem não faça questão de se inteirar muito a respeito. Como eu, por exemplo. Mas, para não fazer tão feio, meterei meu bedelho partindo de uma analogia com algo de que entendo mais - ainda que se trate também de modelo de entretenimento que eu não acompanhe com a regularidade de outrora.
Vejo o pessoal reclamando da seleção masculina e penso em gibis de super-heróis. Sim. Ocorre que, todo mês, religiosamente, deve haver ao menos uma revista nova dos X-Men, do Superman, do Homem-Aranha, do Batman, que seja. Tem de estar lá. Pelos fãs? Pela arte? Pela marca. Os prodigiosos justiceiros mascarados são franquias que precisam se manter vistas, faladas, consumidas. Por isso jamais acabarão. Mesmo que vejamos o Capitão América ou o Homem-Morcego morrerem, um novo personagem assumirá a respectiva identidade secreta e, tempos depois, esteja certo de que os originais estarão de volta com uma explicação mirabolante a reboque. Aliás, isso de fato ocorreu recentemente, com os mesmos heróis citados. É um osso de que os cães da Marvel e da DC não largam mão. Que saia (no mínimo) um gibi novo de nossos personagens mais famosos, ainda que pareça impossível manter a qualidade das histórias publicadas. Aliás, parece, não: acredite em mim, li quadrinho por muito tempo e é impossível sair história boa sempre. O que leva a apelações como mortes, retornos, clones, uniforme novo, corte de cabelo novo, poder novo, versão maligna...já vi de tudo um pouco. Coisas que podem levar meses, até anos, para serem resolvidas. Quando são resolvidas. Mas, ei, todo mês tem história nova do seu herói preferido, não importa quão boçal ou repetitiva ela soe.
Mas, enfim, de volta ao futebol. A seleção brasileira é uma marca. Uma senhora marca. Que o digam a Rede Globo, a Brahma, a Nike, o Ricardo Teixeira. Como os gibis, ela prima por resultados, e não necessariamente por qualidade, mas de uma maneira diferente. A seleção não deixa a desejar porque tem de jogar todo mês. É a forma como se montam as equipes. Via de regra, simplesmente são escolhidos os jogadores que mais estejam em maior destaque pelo futebol jogado em seus times. Entao espera-se que tais profissionais sejam capazes de se relacionar bem numa equipe, mesmo que, para a maioria dos torneios, não haja tempo hábil para tal. Porque eles estão ocupados nas equipes com que mantêm vínculo empregatício e, portanto, presos a uma série de compromissos ao longo de todo o ano. Por mais que todos gostem de acompanhar a "pátria de chuteiras", o negócio seleção brasileira não pode interferir de forma tão incisiva no negócio torneios de futebol no Brasil - e mesmo em outros países onde outros jogadores selecionáveis atuem. Ora, mas esses jogadores são bons, os melhores, e precisamos de uma seleção brasileira, os patrocinadores e as emissoras de TV - ou seria a emissora? - estão contando com isso. Ah, tem o torcedor também. Mas é o de menos, todos os grandes selecionados devem seguir essa mesma lógica burocrática e no fim o mais que temos são jogos e torneios idem; mal-aventurados os saudosos daquele futebol arte.
Talvez o futebol devesse perder essa característica tão "na cara" de empreendimento. Evidentemente, os cães das grandes entidades futebolísticas e associados também não largarão o osso. Mas há que achar um equilíbrio. As meninas estão aí mostrando que, no mundo do espetáculo esportivo, menos pode ser bem mais. Mais consistência, mais regularidade, mais futebol de verdade. E com os gibis se dá o mesmo: todo leitor se pega em algum momento em recordações sobre os "tempos mais simples" de outrora, com histórias menos ambiciosas, complexas em termos de bagagem cronológica e, sobretudo, melhores. Menos negócio, mais diversão, é o que o entretenimento deveria ser.
Mas não, mesmo na remota hipótese de o futebol seguisse essa receita, eu não voltaria a assistir aos jogos. É entretenimento, como qualquer outra coisa na TV, ou como quadrinhos. Cada um escolhe o que lhe agrada.

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