O processo de falação obedece a uma seqüência invariável. Um primeiro momento, o da chamada denúncia. Alguém levanta o problema. Em seguida, uma fase delicada. A das vozes indignadas, governamentais ou não, que se erguem exigindo providências. O terceiro momento requer habilidade.
É a fase das promessas. Garante-se a formação de comissões de inquérito, promovem-se passeatas controladas, editoriais consentidos na imprensa, entrevistas categóricas. Este período é essencial, exige uma avalanche de falação contínua, exacerbada, exasperante. Falar até o total sufoco.
Não deixar ninguém raciocinar. Repisar indefinidamente o assim, até o ponto de completa saturação. Falar, falar até o esgotamento. E então, de repente, ninguém mais pode ouvir sequer comentar as tais denúncias. Elas se esvaziam. (...)
Os sistemas de governo se sucederam, as noções políticas se modificaram, menos a falação. Esta prosseguiu, como tara hereditária.(...)
Veio a Falação. (...) surgiram os protestos, artigos, e falatório contra tudo o que parecia errado para eles. Lutavam, denunciavam, protestavam, organizavam manifestações de rua, assembléias, cortejos, comícios, atos.
(...)
Quando a falação se iniciava, o poder se calava. Por um tempo. Depois, se indignava. Lentamente seus membros passavam a engrossar a fileira dos que contestavam. Até que todos, absolutamente todos, estavam falando.
Enquanto falavam, deixava-se a esperança de que providências seriam tomadas. Era a nuvem de fumaça. As pessoas se esgotavam na falação. Cansavam o assunto, esvaziavam. Morria."
Pergunte-se qual é a falação do momento. E por favor, leia Não Verás País Nenhum.
Nenhum comentário:
Postar um comentário